Me esqueço que preciso respirar.
- Amanda Avalon
- 24 de nov. de 2024
- 3 min de leitura
É comum a gente ouvir que a tecnologia ampliou o mundo, porque, através das telas e da internet, a gente consegue ter acesso a conhecimentos e imagens que jamais seríamos capazes de conceber sem ela. E sim, isso é inquestionável, mas será que apenas saber, assim, em um lugar muito, muito distante dentro de nós, é realmente entender?
Eu questiono porque vejo as pessoas viciadas em pequenas, médias e grandes telas de ultra qualidade HD, que de fato quase replicam a realidade, e penso, será que perdemos a capacidade de entender a diferença ou perdemos a necessidade de viver de verdade? Entrei esses dias em uma loja de eletrônicos e vi uma criança e um adulto, de pupilas dilatadas, a poucos palmos de uma televisão que parecia um espelho mágico, penetrável para outra realidade. Quando foram chamados, eu quase pude ver a alma deles voltando para o corpo. Hoje temos acesso a vídeos curtos realizados por inteligência artificial ou do outro lado do mundo, em línguas e culturas diferentes, mas normalizamos o diferente distante delas e, mais do que isso, igualamos as duas coisas, o que existe com o que sequer existe. As telas tornaram comum o que é muito distinto de nós, e isso não é bom, porque o diferente deveria ser o que nos situa no mundo enquanto detentores de um "não saber" consolador: Não temos controle de nada. Não somos ainda tudo o que é possível ser!
Mas agora nós estamos anestesiados da ideia de que o diferente que existe não impacta em nada na nossa vida cotidiana, principalmente porque os problemas que estão perto de nós são as únicas coisas reais e muito urgentes para resolver. Essa apatia pela exaustão conformista me assusta!
O mundo é enorme de verdade, as paisagens ainda são muitas espalhadas por aí e as pessoas são infinitas, pois cada combinação dentro de um ser é um universo inteiro, mas nós estamos tão lotados dos nossos próprios problemas que a alteridade não consegue penetrar nem uma camada dentro de nós. Quase como o fundo de tela da área de... trabalho... do seu aparelho tecnológico, o mundo lá fora é apenas uma imagem estática ou, com 15 segundos de movimento, que não faz a menor diferença na nossa vida, pois não é parte da nossa realidade. Me apavora essa estranha familiaridade de tratar outros tipos de vida do mesmo mundo que o nosso como se fosse uma obra hollywoodiana de ficção científica, que ficará apenas na gaveta da fantasia, depois de assistida.
Eu sempre sonhei grande. Desde menina, eu sempre soube que aquelas imagens do Discovery Channel ou do National Geographic Channel eram só um pequeno recorte retangular de um cenário muito mais imenso. Eu queria entrar na tela, eu queria olhar 360° com meus próprios olhos, eu queria ouvir o rugido daquele leão com meus próprios ouvidos, enquanto sentia o calor daquela savana, que tremia pelo efeito de evaporação enquadrada pelo cinegrafista, na minha própria pele. Eu nem sei dizer de onde veio essa vontade, mas o Planeta Terra transborda em mim desde que me conheço por gente. Eu sempre tive sede do mundo, sempre tive sede de natureza, sempre tive sede de gente.
De fato, é difícil matar essa sede tendo que fazer as minhas 24 horas "serem as mesmas 24 horas dos bilionários", como dizem os coachings de 14 anos em podcasts de sucesso no YouTube. Eu não sei como nem quando conseguirei me saciar das minhas próprias lágrimas diante das cenas de verdade, que contestam a minha pequenez e insignificância nessa ópera perfeita da existência, mas sei que não é um desejo que eu consigo guardar dentro da gaveta, não é um desejo que consegue ser enganado por uma enorme quantidade de pixels. Esse desejo me consome diariamente sussurrando no meu ouvido:
Eu preciso tocar situações, lugares e pessoas que me tiram o fôlego... se não, me esqueço que preciso respirar!
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